consulta com Betty Milan
SOLIDÁRIO
A sua coluna De luto me chamou a atenção e certamente encorajou a pessoa a quem você respondeu, ajudou-a a suportar a perda do amado.
Gostaria que você enviasse a ela o texto – em anexo – que Santo Agostinho escreveu quando perdeu um amigo.
Desde já obrigado.
Gostei de receber o seu e-mail com O tempo diminui a dor, de Santo Agostinho. Tanto pela sua solidariedade em relação à colega leitora, a quem eu já transmiti a sua mensagem, quanto pela lembrança de um texto que eu aprecio.
Há nele uma das considerações mais importantes sobre o luto. Santo Agostinho, que está muito afetado com a morte de um amigo, pergunta-se por que sofre tanto com a perda e dá a seguinte resposta: “Por ter derramado a minha alma na areia, amando um mortal como se ele não fosse morrer”. Faz uma autocrítica pelo fato de ter sido desmesurado e nada realista.
A frase do santo me remete a uma outra frase complementar escrita por Sêneca, filósofo romano: “A memória dos meus amigos mortos é atraente. Porque eu os possuí como quem tem de perdê-los e eu os perdi como quem os possui ainda”.
É possível que Santo Agostinho tenha lido Sêneca, cujo texto indica que perder não é sinônimo de não ter e ensina a amar os mortais como mortais, ensina a aceitar a realidade.
Quem não consegue fazer o luto do morto na verdade não está dando uma demonstração de amor pela pessoa que morreu, mas de apego à fantasia de que ela nunca morreria. Noutras palavras, não suporta se desapegar do que imaginava e nem viver sem a ilusão da imortalidade.
Abrir mão dessa ilusão é tão difícil que o filósofo Derrida, um dos grandes pensadores do século XX, declarou em sua última entrevista à imprensa que não era possível fazer o luto da vida. À diferença de Sêneca, que consolou os amigos antes de morrer, Derrida se mostrou claramente inconsolável. Talvez por isso tenha afirmado que “a vida é sobrevida – tanto no sentido de continuar a viver quanto no de viver depois da morte”.
PERDER NÃO É SINÔNIMO DE NÃO TER
Publicado em Fale com ela