consulta com Betty Milan
O AMOR DESABROCHA COM AS PALAVRAS
Tenho 48 anos, sou divorciada e mãe de três filhos (20, 15 e 12). Há sete anos, tenho um relacionamento com um homem casado que parece resultar de uma conspiração— a do estranho cupido das salas de bate-papo virtual.
Eu o amo muito, mas morro de ciúme da mulher com quem ele é casado e vive. Não sou capaz de fazer qualquer movimento para o encurralar, mas gostaria muito que ele tivesse coragem de sair do casamento. Mulher nenhuma fica bem na situação em que eu me encontro.
Ele é meigo, terno, tudo de bom. Entre as suas qualidades, está a discrição. Não fala mal da esposa para justificar a própria conduta. Refere-se a ela como a uma boa amiga e me contou que ela cuida da filha única dos dois —hoje, com 18 anos. Colhi esta informação a fórceps num desentendimento entre nós. Na ocasião, ele inclusive quis me contar a história toda deles. Não deixei que fizesse isso, com medo de ele se envergonhar depois.
O fato é que ele está no casamento atual há 24 anos… Tempo demais para ficar preso ao que não está bom. Já disse a ele que não quero estar por perto nas bodas de prata. À luz fria da razão, percebo que a melhor saída seria a porta da rua, porém tenho horror de ficar sozinha. Como abrir mão do carinho, da paixão que ainda existe? Sete anos depois do encontro. Estou descompensada, precisando de uma luz verdadeira.
Quando o sentimento amoroso é contrário à gente, parece conspiração. O homem que você “ama” te faz penar. Por isso, ao se referir a ele, você usa o verbo encurralar, que remete ao curral, o lugar onde a gente prende o gado. Você ama mesmo este homem, que, na sua fantasia, pode ser encurralado como um animal? Gosta da meiguice, da ternura, da discrição, porém fundamentalmente não aguenta a conduta dele em relação ao casamento e a você. Noutras palavras, você “ama” o homem que ele deveria ser e não o que ele de fato é.
Não quer mais saber do triângulo, ainda que a clandestinidade possa ser o suporte da longa paixão de vocês. Na situação de hoje, vive contrariada e se diz que “a porta da rua”, a separação, seria a melhor saída. Só não se separa porque tem medo de ficar sozinha. Mas, na realidade, já está sozinha, porque entre vocês não há acordo. E o desacordo é tal que você precisa se valer do “fórceps” para ficar sabendo da vida dele.
O verdadeiro amor nasce de um acordo tácito entre os amantes e depois desabrocha continuamente, graças ao entendimento que nasce das palavras. Isso significa que ele se produz e se reproduz, não para de se renovar. A delicadeza é a sua principal característica, porque um amante aposta na liberdade do outro. Voa junto, mesmo quando isso implica a separação.
Publicado em Quem ama escuta