consulta com Betty Milan

AMOR É AMOR

Adoro a coluna do Consultório Sentimental. Venho, através deste, contar de forma sucinta a minha situação para vossa apreciação e consequente ajuda. Desde já, agradeço a atenção.

Tenho 28 anos e sou acadêmica de Direito. Minha família é de classe média, bem religiosa e conservadora. Desde 2005, quando saí do meu último emprego, trabalho como garota de programa, saindo com empresários e pessoas da alta sociedade. Me submeti a esse tipo de situação porque a família não tem condições de pagar o meu curso universitário, que será o feito mais importante da minha vida.

Isso posto, depois de três anos “no ramo”, não consigo mais ter prazer sexual — inclusive quando não se trata de um cliente — e a ideia de casamento me causa arrepios, por causa das desculpas esfarrapadas dos maridos para suas esposas. Já busquei ajuda de um psicólogo e uma sexóloga, mas até agora nada funcionou…

  

Quem lê o primeiro parágrafo do seu e-mail tem a sensação de que foi escrito por duas pessoas diferentes. O estilo da primeira frase é coloquial. O estilo do que se segue é o de uma carta oficial. Daquelas que a gente envia para uma instância superior usando o pronome vós.

Já de saída, você mostra duas faces e faz pensar em Jano, um dos deuses mais poderosos do panteão romano, que tinha o dom da “dupla ciência”, a do passado e a do futuro, e, por isso, era representado com dois rostos virados em sentidos contrários. Segundo Ovídio, Jano exercia o poder sobre a terra e sobre o céu.

A história que você conta, depois de se apresentar, ilustra a sua duplicidade. Trata-se de uma história de quem tem duas vidas. Uma de moça de família e outra de garota de programa. Você se justifica dizendo que se submeteu a esta condição para pagar os estudos. Será mesmo que não havia outra solução? Ou será que no papel de garota de programa você tem um gozo do qual não quer abrir mão? O gozo de quem tem um pé no inferno e o outro no céu da fantasia, é protagonista das cenas mais diversas, capaz de ser várias sendo uma, poderosa.

O prazer sexual é incompatível com o trabalho no ramo em que você está e você talvez precise mudar de ramo para voltar a ter prazer. Porque, na cama, você é uma só. A razão da sua duplicidade eu ignoro. Mas sei que você precisa descobrir o porquê da sua vida de Jano para encontrar um caminho novo. Um caminho em que você não seja contrária a si mesma e no qual a sua experiência de hoje não será esquecida. Antes, servirá para iluminar as suas decisões e propiciar a experiência do amor, que não pode ser confundido com sexo ou casamento.

 

Publicado em Quem ama escuta