consulta com Betty Milan
O caminho do meio é o melhor
Tenho um irmão três anos mais velho que eu. Sempre fomos muito ligados e companheiros. Um dia, quando eu tinha 13 anos, ele propôs que nos beijássemos “como namorados”. Concordei e nós nos beijamos algumas vezes. De minha parte, por curiosidade. Nada aconteceu além disso, mas este fato me marcou de forma estranha. Quando cresci e conheci outras pessoas, meu irmão se tornou muito ciumento e passou a me controlar com a justificativa de me proteger.
Um dia, ele me surpreendeu tendo intimidade com um namorado. Ficou possesso e me denunciou. Contou para o meu pai, que sempre foi muito severo. Fui duramente castigada. A partir daí, minha vida se tornou um inferno. Só recuperei meu equilíbrio alguns anos depois, ao me casar. Sou feliz no casamento, porém meu relacionamento com meu irmão não se recuperou. Continuo muito ligada a ele, só que o nosso contato é difícil. Os outros notam isso. Inclusive o meu marido, que não sabe de nada e se dá muito bem com ele. Às vezes, eu me sinto doente e anormal.
A sua frase “De minha parte, por curiosidade” me chamou a atenção. Por que será que você a escreveu? Acaso quis dar a entender que não sentia nada ao beijar e portanto este ato nada significava para você? Até pode ser, mas o beijo deve ter tido um significado importante para o seu irmão. Consciente ou inconscientemente, ele te quis como mulher, não perdoou a sua intimidade com outro homem e se vingou.
Seja como for, ninguém pode infringir a lei da proibição do incesto, que diz respeito à relação sexual entre pais e filhos e entre irmãos. Em todas as sociedades conhecidas, o incesto é proibido e a infração à regra, severamente punida. Trata-se de uma regra universal, através da qual se dá a passagem da natureza à cultura.
Acho que, para superar o problema com seu irmão, vocês dois precisam falar seriamente do que aconteceu no passado. Com a palavra, a gente sempre encontra uma porta de saída. Porque ela muda a realidade vivida. Trata-se do melhor antídoto contra o sofrimento humano. Por isso, o bom médico é aquele que sabe o que diz.
Se for difícil falar com o seu irmão numa conversa a dois, vocês podem recorrer a um especialista, que, além de testemunhar a conversa, saiba orientá-los no sentido de conquistar a verdadeira fraternidade. Para tanto, é preciso abrir mão da paixão do amor ou do ódio, na qual vocês decerto foram educados por um pai “muito severo”.
A educação requer a severidade, desde que ela não seja excessiva. Do contrário, o resultado é a transgressão. O pai “muito severo” não exerce corretamente a função da paternidade. Não só não ensina a respeitar a lei como induz os filhos a desrespeitá-la. É possível que você e o seu irmão tenham caído nas malhas da rigidez paterna. Na educação, como na vida, o caminho do meio é sempre o melhor.
Publicado em Quem ama escuta